Vestir o discurso, despir a consciência
- Camila Braz
- 5 de jun.
- 2 min de leitura
Imagine a cena: uma garota rolando seu feed do Instagram, sorrindo para si mesma com os vídeos curtos que ela não presta realmente atenção. Até que, de repente, a publicação de uma loja famosa invade o feed do seu celular e a imagem de uma bela roupa chama sua atenção: um moletom azul claro, com uma tartaruga desenhada e com a frase “Save the oceans” estampada. A garota não pensa duas vezes – a promoção de 50% de desconto era muito atraente. Ela pula da cama, pega seu cartão e em menos de um “clic” o pedido foi confirmado.
Mas vamos voltar para os bastidores: do outro lado do mundo tem uma costureira, com suor escorrendo na testa após longas horas de trabalho em um dia quente e ela finalmente termina a última costura do moletom. Ela conseguia escutar o som da máquina onde toneladas de água eram usadas para tingir o tecido azul – o mesmo tecido que, apesar da palavra sustentável no site, levava micro plásticos na composição que após a primeira lavagem iriam direto para o oceano. E isso era porque estava estampado “Save the oceans”.
O moletom chegou. A garota usou duas ou três vezes e em todas elas postou uma foto com a legenda #EcoLook. Depois, a roupa ficou esquecida no armário. Os dias se passaram e em uma de suas aulas de escola sobre sustentabilidade entrou o assunto de “greenwashing”. A professora explicou que se tratava de empresa finge ser sustentável para vender mais. Usa rótulos verdes, palavras bonitas, mas não muda nada de verdade.
A garota chegou em casa e pesquisou (de verdade dessa vez) sobre a empresa que ela havia comprado a blusa. Reportagens, entrevistas e imagens da empresa mostraram o real significado de greenwashing.
A empresa terceirizava suas fábricas em regiões com leis ambientais fracas. Pagava pouco. Produzia em massa. Usava termos como “biodegradável” sem certificação. E o famoso moletom? Ele era parte de uma coleção chamada “Azul Profundo”, lançada às vésperas do Dia Mundial dos Oceanos – uma campanha feita para comover, não para mudar.
De repente, o moletom parecia mais pesado do que parecia. Ele carregava diversas promessas não cumpridas e coisas não vistas.
Dessa forma, gostaria de trazer a discussão: quantas vezes nós, para nos encaixarmos na moda e nas discussões promovidas atualmente, tomamos decisões apressadas para nos “exibir”. Quantas vezes você publicou uma postagem sobre o Dia Mundial do Meio Ambiente, mas nem sabia que esse dia existia? Quantas vezes você comprou uma roupa que se dizia sustentável, mas esqueceu de pesquisar sobre a empresa?
A questão é de que buscamos a perfeição. Buscamos parecer perfeitos. Mas não se trata de perfeição, se trata de consciência.
Salvar o planeta não é algo que se exibe. É algo que se vive. E o primeiro passo para mudar o mundo pode ser simplesmente não acreditar em tudo o que reluz em verde.
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